Cheguei a escrever um pouquinho sobre as Drags no post Crossdressing / Crossdresser / CDzinha pois essa arte de transformação nada mais é do que uma vertente do crossdressing que está intimamente ligada às artes performáticas. Nesse post vou me aprofundar na história dessas rainhas.
O início de tudo pode-se dizer que foi o teatro grego. O próprio teatro nasceu na Grécia Antiga (século VI a.C.) e, na época, somente homens podiam interpretar, então os personagens femininos eram vividos por atores homens com máscaras femininas, vale lembrar que as roupas ainda não distinguiam os gêneros direito. A situação se manteve assim por mais de 2 milênios, tanto que as peças de Shakespeare (século XVII d.C.) ainda eram interpretadas exclusivamente por homens.
Pintura: Hamlet recebendo os atores (1875) por Władysław Czachórski |
A medida que as mulheres estavam mais atuantes no teatro, os homens passaram a se vestir de mulher por motivos cômicos e para sátiras, abusando de maquiagens e trajando vestimentas que parodiavam o estilo de vida da alta sociedade. Foi neste momento que os personagens ganharam características de caricato feminino, algo marcante na cultura drag que está presente até o momento.
Pintura: Folião no carnaval (1616-17) por Frans Hals Dois homens cercam uma garota ricamente vestida. Provavelmente se tratava de um ator pois as mulheres não podiam se apresentar nessa ocasião. |
Os female impersonators (transformistas) rapidamente se tornaram referência no movimento e surgiu então a primeira drag queen famosa: Julian Eltinge. Sua popularidade ultrapassou o vaudeville e seu talento artístico lhe rendeu turnês pela Europa e pela América. No teatro surpreendeu o público com o papel principal de “A Viúva Fascinante” (1911). Seu sucesso foi tanto que ele se tornou um dos artistas mais bem pagos de sua época!
Julian Eltinge (1881-1941) |
Apesar da breve ascensão desses artistas, as grandes guerras (1914-1945) chegaram para acabar com a festa. Essa foi uma época de diversas mudanças, no post sobre a história da distinção entre gêneros na moda eu citei a mudança na responsabilidade social feminina e nos vestuários femininos. No caso das drags o baque foi grande pois o lazer ficou em segundo plano e uma onda conservadora tomou conta de diversos países.
Nos Estados Unidos, por exemplo, a lei seca junto com a criminalização da homossexualidade obrigou muitos artistas a se esconderem em clubes clandestinos para terem a oportunidade de se expressarem e se divertirem. Mesmo atuando em ambientes escusos, as drags vivenciaram uma onda de popularidade underground que tomou conta de locais como Los Angeles, Nova York e São Francisco, esse período ficou conhecido como Pansy Craze (1930-1933). Outra coisa, esses clubes noturnos ilícitos dedicados à homossexuais também moldaram às casas noturnas dos dias de hoje, na minha cidade, por exemplo, muitas baladas LGBT são aclamadas por gente de todos os públicos!
Bailarinos, 1929. Nova York |
Kitt Russell (1951) |
Tim Curry e David Bowie |
Divine, Lady Bunny e Boy George |
Priscilla, A Rainha do Deserto (1994) e Para Wong Foo, Obrigado Por Tudo! Julie Newmar (1995) |
Como consequência mais casas noturnas estão investindo em shows de drag queens, os cachês aumentaram para artistas de destaque e a cena noturna floresce com uma variedade de jovens que se divertem com o transformismo. Até podemos ver pessoas que não são do meio artístico nem da comunidade LGBT se montando e curtindo a vida social com muito glitter, inclusive tem homem hétero e mulheres cis na onda aproveitando a liberdade de expressão proporcionada pela cultura drag.
Eu acho incrível o quanto o transformismo intriga e, ao mesmo tempo, entretém. O impacto da arte drag em questões como a quebra dos padrões de gênero e a liberdade de expressão são consideráveis e, apesar de muitos verem o caricato como uma ofensa às mulheres, eu acredito que a visibilidade do movimento compensa porque abriu caminho inclusive para comunidade trans!♥
"Drag é, na verdade, tirar sarro da identidade. Nós somos metamorfos. Nós somos algo como: ok, hoje eu sou isso, agora eu sou um cowboy, agora sou isso". RuPaul Andre Charles |