quarta-feira, 8 de setembro de 2021

Bimbo: vulgar por vontade própria

A palavra Bimbo costuma ser empregada de maneira pejorativa na língua inglesa para insultar mulheres consideradas atraentes, sexualizadas, ingênuas e pouco inteligentes, algo parecido com o "loira burra" que já foi muito popular aqui no Brasil. No entanto, o termo Bimbo está passando por uma transformação e, atualmente, pode até ser considerado um estilo de vida.

Para dar um panorama do termo no passado, você pode olhar o artigo "O ano das Bimbos" do New York Post de 2007 onde o tabloide catalogou, de maneira cruel, as mulheres mais notórias daquele ano consideradas por eles como bimbos, incluindo a Amy Winehouse (uma “bimbo-alternativa” que “eles não conseguiram fazer ir para a reabilitação”), Jamie-Lynn Spears (uma “bimbo-em-treinamento” porque ficou grávida aos 18 anos e posteriormente monetizou suas fotos de gravidez), Britney Spears (que se separou naquele ano e raspou a cabeça), Paris Hilton, Mischa Barton e a própria bimbo-protótipo, Anna Nicole Smith.

Durante muito tempo foi assim que o mundo entendeu o que significava a palavra bimbo. O termo era usado para privar as jovens de sua humanidade e de seu livre arbítrio, algo como uma censura moral, e hoje tem até o termo slut-shaming que descreve bem esse tipo de situação. Era inferido a promiscuidade sexual como um sinal de depravação e falta de inteligência. Também era um conceito usado para diminuir o trabalho cultural de algumas das jovens mais poderosas da época.

O termo evocava inconscientemente imagens de grandes seios de silicone, longos cabelos loiros clareados, roupas justas e maquiagem pesada, enquanto comunicava que todas essas coisas eram de alguma forma inerentemente imorais. Inclusive as conotações negativas do termo são oficiais: a definição de Bimbo no dicionário inglês é "um termo depreciativo para uma mulher atraente, mas frívola".

Bimbification invertida, por sortmid

No entanto, pode-se dizer que a virada de jogo começou com o desenho acima. No ano de 2017 essa imagem viralizou e tomou proporções inesperadas. Ela foi compartilhada milhares de vezes em várias redes sociais, com a maioria das pessoas expressando repulsa pela aparente mensagem sexista de que mulheres gostosas não podem ser inteligentes e mulheres inteligentes não podem ser gostosas.

Acontece que a imagem é, na verdade, um artigo erótico a respeito de um fetiche chamado "transformação bimbo" (em inglês: bimbofication), e o artista responsável por ela, sortimid no DeviantArt, não imaginava que isso seria visto com algo tão controverso. Até porque ele passou vários anos fazendo esse tipo de arte erótica sem obter grande repercussão, mas nesse caso ele precisou criar uma conta no Twitter para tentar explicar a situação. “Isso é chamado de 'transformação bimbo'. Seu público se excita com a ideia de ver uma pessoa comum se transformar em um estereótipo hipersexualizado. Ele representa pessoas perdendo suas inibições e desfrutando de sua própria sexualidade. Algumas pessoas, como o cliente que encomendou a imagem em questão, também gostam de imaginar como seria o processo inverso. ”

Outra arte no estilo bimbofication do sortmid

Essa discussão acabou inspirando diversas pessoas a tentar quebrar esse esteriótipo. Isso é notável na rede social TikTok, onde a hashtag bimbo está em alta e evoluiu para uma figura influenciadora, chegando até a carregar uma posição política consigo. Por exemplo, a influenciadora Chrissy Chlapecka e seus colegas BimboTokers dizem que a nova onda bimbo é fortemente a favor da legalização do trabalho sexual, a favor do movimento LGBTQ, a favor do movimento Black Lives Matter e contra o patriarcado.

Além disso, essa onda bimbonizadora não é exclusiva para mulheres cis – toda e qualquer pessoa que se alinha com a ultra-feminilidade e encontra alegria em ser ingênua (ou parecer) pode se identificar como bimbo. Acima de tudo, a bimbo moderna não é necessariamente ignorante ou não inteligente, mas com certeza a sua personalidade não gira em torno de sua formação acadêmica ou do seu currículo profissional.

Syrena, outra influenciadora que tenta quebrar esse paradigma e que chama seus seguidores de Bimbos da Nova Era, é uma estudante universitária da área de ciências da saúde. Sendo mulher em um programa educacional rigoroso, ela rejeita a expectativa de que tenha de se distanciar da sua hiperfeminilidade para ser levada a sério em ambientes profissionais ou acadêmicos.

"Você não se preocupa com a visão elitista da sociedade sobre a inteligência acadêmica? Você apóia todas as mulheres, independentemente do cargo delas ou se elas fizeram cirurgia plástica ou modificações corporais?" Syrena pergunta a seus seguidores, antes de questionar se eles também sonham em ter dezenas de sapatos de salto e idolatrar a falecida modelo Anna Nicole Smith.

A influenciadora acrescenta que ela mesma teve que desaprender seu próprio "olhar masculino interior" no processo de se identificar como uma bimbo. Mergulhar de cabeça no hiper-feminino não deve ser equiparado à ceder à vontade masculina. Alguns tiktokers deixam claro que estão vestindo o traje sexy não para atrair os homens, mas para zombar da perspectiva deles.

É por isso que a repaginada das Bimbos é uma atitude transgressiva e essas bimbos da nova era estão aprendendo a voltar o olhar para si mesmas. "Hoje vou apenas focar em ser bonita, porque eu quero. Vou deixar de ser assertiva, vou deixar de cuidar de todos os outros. Vou apenas cuidar de mim, me sentir bem e bonita. Foda-se o resto de vocês."

Tiktokers bimbos da Nova Era: Chlapecka e Syrena

Ainda podemos fazer um paralelo com o termo "mulher vulgar" aqui no Brasil. Quando empregado como adjetivo para uma mulher, vulgar é aquela despudorada, sem o comportamento requintado de uma dama e que exibe livremente sua sexualidade. O termo tenta deferir o mesmo desconforto estigmatizado da palavra bimbo, e, pelo que parece, em ambos os casos essa referência de mulher se trata, na verdade, de uma referência à mulher livre. E é exatamente esta mulher que o moralismo sempre denominou como vulgar: a mulher que não se apega às amarras que o pudor lhe impõe.

Esse mito em torno da mulher vulgar é desumano. A vulgaridade é usada como uma espécie de condenação social generalizada à mulher que se assume dona de si, à mulher que se nega ao pudor. Por isso mesmo é incomum ouvirmos falar em “homens vulgares”. Para os homens, principalmente os héteros, a sociedade garante o direito à promiscuidade, ao despudor e ao que é imoral, enquanto que para as mulheres a mesmas atitudes são consideradas chulas, pobres e desprezíveis. Por exemplo, você já notou que os termos "homem galinha" e "mulher galinha" significam exatamente o mesmo mas costumam ser usados de maneira antagônica? 

Tanto a bimbo quanto a mulher vulgar é aquela pessoa que não tem medo de se mostrar tal qual ela é. É quem não esconde os seus desejos, as suas propensões promíscuas, as quais, em maior ou menor proporção, todas têm. E esse olhar de desprezo é o modo sutil que a sociedade encontrou de ditar o comportamento, de conter a liberdade, de rotular. No fim somos vulgares quando não camuflamos nossos desejos.

A sociedade que espera que a mulher seja meiga, correta e submissa costuma atribuir a vulgaridade à mulher livre. E essa mesma sociedade que diz que a vulgaridade é uma falta de respeito com o próximo não percebe que a falta de respeito se encontra justamente no preconceito com as atitudes dessas mulheres. O certo é respeitar as escolhas de cada um, principalmente se concerne às questões individuais de estilo de vida. Fora que, convenhamos, é maravilhoso poder conviver com ou, ao menos, poder admirar uma mulher livre de perto.

Transformação da Rainha Bimbo – Alicia Amira

Eu achei interessante pesquisar sobre esse assunto pois vejo similaridade no caso da relação dos homens com o crossdressing. Assim como algumas mulheres buscam a liberdade de se apresentarem com uma imagem hiper-feminina sem serem julgadas, alguns homens buscam a liberdade de se apresentar com uma imagem feminina (as vezes hiper-feminina) sem serem julgados. Ambos os casos simplesmente buscam acabar com preconceitos bestas da nossa sociedade. 

Então, se você for uma dessas pessoas que gostaria de usar saias mais curtas (ou ao menos gostaria de poder usar saias), roupas mais justas, pintar o cabelo ou simplesmente se expressar com sensualidade, esta é a sua chance! Se desprenda desses conceitos sociais de gênero que limitam a sua liberdade. Minha mensagem para você é esta: não viva a sua vida sendo metade da pessoa que você pode ser. Seja você mesmo e faça isso dando 100% de si.

Esse movimento de libertação das Bimbos pode parecer bobo mas é algo de extrema importância tanto para as mulheres quanto para os homens. Juntos podemos acabar com o estigma. Juntos, podemos criar um mundo onde cada um possa ter orgulho de si mesmo, orgulho de abraçar o seu jeito de ser e orgulho de se apropriar de sua própria sexualidade sem que ninguém pense menos dela.

Crossdresser Bimbo – Jeanne Lazareva

Sei que eu tenho um pouco de bimbo dentro de mim e sei que diversas outras crossdressers que eu conheço também tem. Então vou deixar umas fotinhas minhas pra mostrar o estilo bimbo que eu aprecio. Não sou super fã de maquiagem mega elaborada e chamativa, mas um vestido curto, algo colado ou um salto alto eu não dispenso!

1 Comentário(s)
Comentário(s)

Um comentário:

Anônimo disse...

Preconceito e não aceitar diferenças só prejudica e empobrece a sociedade. Sejamos livres.
Suas fotos no estilo bimbo ficaram espetaculares.